No dia 28/04/2012 aconteceu o Workshop Terapêutico coordenado por mim e por Marcela de Tilio. No folder de divulgação (alguns posts abaixo) podem dar uma olhada na programação do evento. Foi tudo muito legal!!! A Marcela conduziu as vivências, e eu, a aula e a roda de conversa, que na verdade acabaram se misturando.
A pedidos de alguns dos participantes e de pessoas que não puderam participar, compartilho abaixo o texto que usei para a aula e para a roda de conversa (que foram uma continuidade da outra). Inicialmente pensei em deixar apenas a teoria, mas resolvi deixar as perguntas que fiz ao grupo para reflexão, pois pensei que quem não pôde estar presente pode fazer esta reflexão consigo mesmo, acredito que pode ser muito produtivo também!!!
Espero que gostem!
Ao fim do texto, uma foto tirada durante a aula...
WORKSHOP TERAPÊUTICO
A TOTALIDADE QUE SOMOS NÓS – VIVÊNCIAS E REFLEXÕES
AULA DIALOGADA – REFLETINDO SOBRE A TOTALIDADE QUE SOMOS NÓS
Nos reunimos aqui hoje com o
objetivo de autoconhecimento, mas o
que vocês chamam de autoconhecimento?
Autoconhecimento não é só conhecer (razão) - O autoconhecimento não
é apenas “conhecer” no sentido racional da palavra, de saber mais informações
sobre si. É também sentir, ser tocado
por essas descobertas. Mais do que isso, é ENTRAR
EM CONTATO, DE FORMA PROFUNDA, COM AQUILO QUE REALMENTE SOMOS.
Píndaro (518 – 438 a.C.) – poeta
grego: “Torne-se o que você é”
Aristóteles (384 – 322 a.C.) –
filósofo grego: cada coisa criada tem em si a forma que lhe é exclusivamente
própria e a vida deve levar a essa forma própria
Nietzsche (1844 – 1900) –
filósofo alemão: “O que diz a sua consciência: tu deves te tornar quem tu és”
(A Gaia Ciência); “Torna-te quem és!” (Assim falava Zaratustra)
Jung (1875 – 1961) – psiquiatra
suíço: o objetivo da psicoterapia é tornar-se si-mesmo.
James Hillman (1926 – 2011) –
psicólogo norte-americano: Somos o que
somos e não poderíamos ser de outra maneira
Fala-se de um processo de se
tornar o que se é, algo que vai além do ego, daquilo que conhecemos de nós
mesmos, há mais de 2500 anos.
O que vocês entendem por isso,
tornar-se o que se é?
Qual o sentido disso para
vocês?
Como imaginam que isso se dá?
Jung foi o primeiro psicólogo que
contemplou a individualidade e
convidou seus pacientes a abraçarem a
pessoa única que cada um deveria ser. Isso significa CONFRONTAR O QUE A SOCIEDADE DIZ E ESPERA DE VOCÊ, com o que você
pensa, sente, é.
O que acreditam que a
sociedade pede hoje para as pessoas?
Acham que as pessoas costumam
tentar corresponder?
E acreditam que conseguem?
Como é tentar corresponder?
Resultado: não nos aceitamos - Esse processo de tentar corresponder
ao que a sociedade pede, faz com que não nos aceitemos.
Autoconhecimento = autoaceitação. Conforme nos conhecemos, podemos
aceitar mais nossos aspectos, e principalmente, nossas diferenças.
Pensem, já ouviram uma voz
dizendo que deveria fazer, ou como se sentia em determinada situação, ou mesmo
um sonho indicando algo, e os ignorou? Por que? Como foi?
O que sabemos de nós (consciência) X o que somos (vai além –
inconsciente) - Diante disso, partimos da ideia de que existe algo que
sabemos de nós, e algo que vai além, que amplia o que somos, por mais que não saibamos ao certo o que isso é.
Estes aspectos que não conhecemos é o que chamamos de inconsciente.
Portanto, ir além do que
conhecemos e do que é esperado de nós, só é possível através de um CONFRONTO COM O INCONSCIENTE. E de um
encontro com o que Jung chamou de verdadeiro Self, ou Si-mesmo. – ENCONTRO COM O SELF
Assim, a base do trabalho de
Jung, em quem nos baseamos para o encontro de hoje, é a PROMOÇÃO DA INDIVIDUALIDADE.
Já tinham pensado nisso?
Promoção da individualidade!!!
Estamos entre 2 MUNDOS: mundo da percepção externa e
mundo da percepção do inconsciente. Estamos aqui hoje para possibilitar o DIÁLOGO ENTRE ESSES DOIS MUNDOS, mais
especificamente entre o ego, ou seja, aquilo que conhecemos de nós mesmos, e o
Si-mesmo, nossa essência, aquilo que realmente somos. – ego X si-mesmo
Momento de parar e olhar para dentro - O que propomos hoje é um momento
de parada, de olhar para dentro, para si mesmo, em busca de algo que a
princípio nem sabemos o que é, mas que sentimos, e por isso existe.
Disse Clarice Lispector: “Ela
acreditava em anjos, e porque acreditava, eles existiam”
Vivemos num mundo racional, lógico, positivista, que atribui
realidade apenas àquilo que podemos ver, tocar, cheirar, ouvir, provar.
Entretanto, se estão aqui hoje, provavelmente é porque sentem que há mais coisas além disso, e nossa
ideia, aquilo que faz sentido para nós, e que pensamos em compartilhar com
vocês hoje, é que aquilo que sentimos,
pensamos, imaginamos, acreditamos, é muito real, talvez mais real do que tudo o
que os 5 sentidos afirmam. Como disse Clarice Lispector, são essas as
coisas que existem.
Doença da atualidade: viver um lado só da vida, distância de nós - Talvez
possamos afirmar que a grande doença de nossa época é a distância de nós mesmos
e a falta de sentido na vida. É isso o que encontramos na clínica atual.
Busca pela distribuição equilibrada de energia
Vamos conversar um pouco sobre como tem distribuído sua energia em suas vidas,
e como gostariam de distribui-la.
Unilateralidade – Desequilíbrio. Se a energia é investida de forma equilibrada, a roda gira, a vida anda.
Essa parada, esse olhar para a
vida, requer uma atitude diferente.
Vamos falar um pouco sobre ESPIRITUALIDADE.
Recorremos à origem da palavra. Religião vem do termo latino religare
= acurada e conscienciosa observação de certos fatores dinâmicos.
Utilizamos novamente a ideia de Jung, que relaciona a religião, religiosidade,
ou o que podemos chamar de espiritualidade para ficar bem claro que não falamos aqui de qualquer instituição
religiosa, à ideia de uma atitude religiosa. Esta seria uma atitude inerente, arquetípica, ao
espírito humano, que pode ser considerada como uma consideração e observação
cuidadosas de fatores dinâmicos que influenciam a consciência e, portanto, a
experiência.
Cito Jung: “Entre todos os meus doentes na segunda metade da vida, isto é, tendo
mais de 35 anos, não houve um só cujo problema mais profundo não fosse
constituído pela questão de sua atitude religiosa. Todos, em última instância,
estavam doentes por ter perdido aquilo que uma religião viva sempre deu em
todos os tempos aos seus adeptos, e nenhum curou-se realmente sem recobrar a
atitude religiosa que lhe fosse própria. Isto, está claro, não depende
absolutamente de adesão a um credo particular ou de tornar-se membro de uma
igreja”.
Conseguem entender o que seria
essa atitude religiosa? Faz sentido para vocês?
Tomamos como ponto de partida
então o homos religiosus que existe dentro de nós, aquele que considera
e observa cuidadosamente certos fatores que agem sobre nós e sobre nosso estado
geral.
Muito bem, conversamos sobre
diversas coisas pela manhã.
O que ficou de mais forte?
O que veio nesse tempo em que
paramos para nos alimentar?
Essa relação com o que age sobre nós, e, como dissemos anteriormente,
com aquilo que realmente somos, se
dá através dos SÍMBOLOS. É da
essência do símbolo conter ambos os
lados (racional e irracional)
A palavra símbolo vem da palavra grega symbolon,
que significa “aquilo que foi colocado junto”. No uso grego original, o símbolo
referia-se às duas metades de um objeto que era dividido em duas partes como
sinal de compromisso e que depois servia como prova de identidade daquele que
apresentasse uma das partes diante do que estivesse de posse da outra. O
símbolo nos leva à parte que falta do homem inteiro.
O que entendem quando falo de
símbolo?
No que pensam?
Símbolo é tudo aquilo que TRAZ UM SIGNIFICADO PROFUNDO, QUE VAI ALÉM
DELE PRÓPRIO. São: imagens que chegam até nós nos sonhos, imaginações, desenhos, pinturas, esculturas. Também podemos
chamar de símbolos, doenças e eventos de
coincidência significativa, que alguns chamam de acaso. A linguagem da consciência são as palavras,
e a linguagem do inconsciente são os símbolos.
História da forma de expressão e comunicação dos homens primitivos.
Estabelecer uma relação consciente com o inconsciente,
saber que ele está lá dentro de nós e que ele afeta tudo o que pensamos e
fazemos, sozinhos e juntos, em pequenos grupos e como países, muda radicalmente todos os aspectos da
vida.
Além da atitude religiosa, propomos hoje uma segunda atitude, o que podemos
chamar de ATITUDE SIMBOLIZADORA: é
uma forma de estabelecer a conexão com o
profundo na vida, um momento de parar com as atividades diárias e lançar um
olhar para nós mesmos, acessando os símbolos que se manifestam.
O objetivo básico da psicoterapia junguiana, e o que norteia nosso
trabalho hoje também, é tornar consciente o processo simbólico, uma vez
que enquanto se está inconsciente da dimensão simbólica da existência, as vicissitudes
da vida são experimentadas como sintomas ou acaso, ou seja, coisas sem
valor ou sentido, e a FALTA DE SENTIDO CONSTITUI A MAIOR AMEAÇA À HUMANIDADE.
Para que se possa vivenciar os símbolos como tais, é preciso que se
esteja preparado para se deixar tocar emocionalmente por ele. A
proposta é a de se colocar diante do símbolo e deixar-se transformar por ele,
isso é, na medida em que o concebemos como máquina
transformadora de energia. Ele é um veículo que conduz à transformação ou
um meio de transformação.
Imagens,
quando objetivadas, se tornam mais concretas, assim não temos tanta dificuldade
para trabalhar com elas, NOS
RELACIONAMOS COM ELA, SUPERA-SE A IDENTIFICAÇÃO COM O PROBLEMA E ESSE É O
PRIMEIRO PASSO PARA A CONSCIENTIZAÇÃO.
Já tinham pensado nisso? Em algum
momento já se perceberam fazendo ou sentindo necessidade de se expressar
simbolicamente?
Nos símbolos, nossas dificuldades
especiais e atuais tornam-se manifestas, assim como nossas próprias
possibilidades de vida e desenvolvimento. Nas dificuldades depositam-se as
possibilidades de desenvolvimento.
É inerente à psique a tendência para se
desenvolver, estar em movimento: aqui, ela é um SISTEMA AUTORREGULADOR. Falar mais
CONCEPÇÃO
CAUSAL X FINALISTA
Aquilo que para o ponto de vista causal
é fato, para o ponto de vista finalista é símbolo, e vice-versa. A causa não possibilita uma evolução,
satisfeita a exigência causal, a alma não pode ficar parada neste estágio, mas
deve evoluir, convertendo-se as causas, para ela, em meios ordenados a um fim,
isto é, expressões simbólicas de um caminho a ser percorrido
Essa busca por um sentido, que na verdade é o que venho dizendo desde o
início dessa conversa, é o que Jung chama de processo de individuação. É o PROCESSO
DE “TORNAR-SE SI-MESMO”. Esse processo pode começar e se desenvolver sem
que se tenha consciência disso, mas se se pretende assimilá-lo à consciência, é
necessária uma certa dose de conhecimento. Se não for assimilado, ou se não
atingir uma intensidade extraordinária, o processo pode se perder novamente no
inconsciente. Assim, pode-se compreender que apesar da importância e do poder
do Self nesse processo, o ego tem papel essencial, pois é por intermédio dele
que ocorre qualquer tipo de ampliação da consciência decorrente de todas as
vivências pensadas até agora.
Procurar
sentido nos eventos de nossas vidas, conexão com o profundo (sincronicidade). Utilizando-se
desse olhar, é possível pensar nos aspectos
do mundo, tanto externo quanto interno, como ligados por uma rede de significados.
Um exemplo clássico e claro de atitude
simbolizadora é o próprio Jung. Após seu rompimento com Freud, em 1913, Jung
passou por 6 anos de crise e sofrimento
intensos, os quais poderiam ser vistos até mesmo como de perturbação
psíquica, não fosse sua atitude simbolizadora. Durante esse tempo, o autor
dividia seu tempo de trabalho com profunda imersão no inconsciente, ao pintar,
desenhar, esculpir e “brincar” com pedras na areia, à margem do lago de sua
casa, ou seja, ele se dedicou aos
símbolos, entrou em atitude simbolizadora. Jung registrou essa imersão em
um livro denominado “Livro Vermelho”. Foi a
partir da relação com o símbolo que o autor escreveu todos os dezoito volumes
de sua obra.
Neste momento, gostaria de encerrar
fazendo uma observação sobre os momentos de crise.
Depois de tudo o que conversamos, qual
a relação que conseguem fazer entre momentos de crise, sofrimentos e as
atitudes de que vínhamos falando, religiosa e simbólica?
Se levamos essas atitudes: religiosa e
simbólica, para nossas vidas, eles podem ser vistos como oportunidades.
Em “Psicologia e Alquimia”, Jung fala
sobre o homo totus, o homem completo, oculto e não manifesto, homem mais
amplo e futuro, que é aquilo que o homem passa a vida inteira procurando.
Ele diz que, entretanto, o caminho
correto que leva à totalidade é aquele feito de desvios e extravios do destino,
aquele que consiste as experiências de “difícil acesso”.
Este caminho, a princípio, pode ser caótico e imprevisível, e só aos poucos vão
se multiplicando os sinais de uma
direção a seguir. Jung considera que o caminho não segue uma linha reta, e
sim algo que pode ser definido como ESPIRAL.
Nosso objetivo hoje, e que também é o
objetivo da terapia é que as pessoas não
sejam estagnadas, que se tornem flexíveis e aprendam a perceber diversas
influências possíveis em sua vida; aprender a lidar com “estiagens”, a suportar estagnações até algo novo nascer,
suportar tensões sem perspectiva de sucesso; lidar criativamente com a vida
própria, lidar, caminhar, lidar com tempos de estagnação, ser capaz de aceitar
a nós mesmos como alguém em transformação, com todos os cantos e quinas que
forma uma pessoa; assumir o risco de ser si-mesmo. Costumamos tentar solucionar
problemas com velhos métodos.
Disse Albert Einstein: "Não há
maior sinal de loucura do que fazer a mesma coisa repetidamente e
esperar a cada vez um resultado diferente."
O objetivo então é levar o indivíduo a realizar experimentações com o próprio
ser e conseguir lidar de modo
criativo com seus problemas e com as peculiaridades de seu ser.
Por fim, ressaltamos que tornar-se o que se é não significa
tornar-se plano, harmônico, polido, mas sim aceitar cada vez mais em si o que
se é, o homogêneo na própria personalidade juntamente com “as quinas e os
cantos”.