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segunda-feira, 25 de junho de 2012

Aula Dialogada - Nada é por Acaso: Sincronicidade e a Teoria das Possibilidades


 Nosso Workshop aconteceu no último sábado e novamente foi maravilhoso!
Abaixo disponibilizo para quem se interessar o material da minha aula dialogada! Espero que gostem!

2º Workshop Terapêutico
Nada é por Acaso: Sincronicidade e a Teoria das Possibilidades

Aula Dialogada – Sincronicidade: um princípio de conexões acausais
A ideia hoje é que possamos pensar nos eventos da vida e em como o que está dentro de nós e o que está fora, estão interligados.
A Marcela trouxe uma fala essencial para nós, que abrange mais a visão da terapia holística e da física quântica, explicando como é possível que eventos de diferentes ordens, mas aparentemente ligados, tenham relação um com o outro.
Eu trago uma explicação mais da psicologia.
Antes, gostaria de contar a vocês um conto indiano. Há muitas versões desse conto, eu escolhi uma delas para contar hoje.
UM CONTO INDIANO
“Há muitos anos vivia na Índia um rei muito sábio e muito culto, já havia lido todos os livros de seu reino. Seus conhecimentos eram numerosos como os grãos de areia do rio Ganges. Muitos súditos e ministros, para agradar o rei, também se aplicaram aos estudos e às leituras dos velhos livros. Mas viviam disputando entre si quem era o mais conhecedor, inteligente e sábio.
Cada um se arvorava em ser o dono da verdade e menosprezava os demais. O rei se entristecia com essa rivalidade intelectual. Resolveu, então, dar-lhes uma lição.
Chamou-os todos para que presenciassem uma cena no palácio. Bem no centro da grande sala do trono estavam alguns belos elefantes. O rei ordenou que todos os soldados deixassem entrar um grupo de cegos de nascença.
Obedecendo às ordens reais, os soldados conduziram os cegos para os elefantes e guiando-lhes as mãos, mostraram-lhes os animais. Um dos cegos agarrou a perna de um elefante; outro segurou a cauda; outro tocou a barriga; outro, as costas; outro apalpou as orelhas; outro a presa; outro a tromba.
O rei pediu que cada um examinasse bem, com as mãos a parte que lhe cabia. Em seguida, mandou-os vir à sua presença e perguntou-lhes:
- Com que se parece um elefante?
Começou uma discussão acalorada entre os cegos.
- O elefante é como uma coluna roliça e pesada.
- Errado! – interferiu o cego que segurou a cauda. – O elefante é tal qual uma vassoura de cabo maleável.
- Absurdo! – gritou aquele que tocou a barriga. – É uma parede curva e tem a pele semelhante a um tambor.
- Vocês não perceberam nada – desdenhou o cego que tocou as costas. – O elefante parece-se com uma mesa abaulada e muito alta.
- Nada disso! – resmungou o que tinha apalpado as orelhas. – É como uma bandeira arredondada e muito grossa que não para de tremular.
- Pois eu não concordo com nenhum de vocês – falou alto o cego que examinava a presa.
- Ele é comprido, grosso e pontiagudo, forte e rígido como os chifres.
- Lamento dizer que todos vocês estão errados – disse com prepotência o que tinha segurado a tromba. – O elefante é como a serpente, mas flutua no ar.
O rei se divertiu com as respostas e, virando-se para seus súditos e ministros, disse-lhes:
- Viram? Cada um deles disse a sua verdade. E nenhuma delas responde corretamente a minha pergunta. Mas se juntarmos todas as respostas poderemos conhecer a grande verdade. Se souberem ouvir e compreender o outro e se observarem o mundo de diferentes ângulos, chegarão ao conhecimento e à sabedoria”.

Achei importante iniciar nossa conversa com este belo conto, pois o que apresentamos hoje são partes de um todo. A Marcela tem a visão de algumas partes, eu de algumas outras e juntas tentamos chegar um pouco mais perto do que seria o Todo.
Temos hoje várias maneiras de falar de uma mesma coisa, e cada um de vocês vai se identificar com um olhar, com uma parte do que vamos mostrar. Espero que ao fim desse nosso encontro possamos de fato termos dado alguns passos a mais em direção à totalidade.
Dito isto, vamos lembrar que o que nos fez preparar esse encontro foi a nossa ideia de que os eventos da vida estão conectados de alguma forma, e vem imbuídos de sentido. Os eventos a que nos referimos aqui, são aqueles que costumamos chamar de acaso.
Para pensarmos nisso, precisamos pensar no que é o acaso.
O que vocês chamam de acaso? Em que situação definem algo como acaso? Dizer que algo acontece ao acaso, traz algum tipo de explicação?
Considera-se acaso tudo aquilo que não pode receber uma explicação causal, são eventos que parecem ter algum tipo de relação entre si, mas esta relação não é de causa, logo não pode ser explicada pelo racionalismo vigente. Dizer que algo acontece ao acaso na verdade não traz explicação alguma, apenas alivia a angústia de não conseguir compreender, objetivamente, por que determinado evento aconteceu. Entretanto, muitas vezes a relação entre eventos aparentemente desconectados é tão forte, que a angústia permanece e a explicação de que aquilo foi uma coincidência não é suficiente.
“Quando você alcança uma idade avançada e olha para o tempo de vida que ficou para trás, pode lhe parecer que este teve uma ordem e um plano consistentes, como se concebidos por algum romancista. Acontecimentos que quando ocorreram pareciam acidentais e passageiros transformam-se em fatores indispensáveis na composição do enredo. E assim, como as pessoas que você conheceu por mero acaso transformaram-se em agentes importantes de transformação na sua vida, você também terá servido sem o saber como agente atribuidor de significação as vidas de outras pessoas. O sistema todo movimenta-se e ajusta-se como uma grande sinfonia em que cada coisa inconscientemente estrutura as demais”. (Joseph Campbell, 1990)
Jung foi um psiquiatra suíço que viveu entre 1875 e 1961. Ele começou a pensar nas coincidências significativas a partir das conversar com Albert Einstein, quando este estava desenvolvendo a Teoria da Relatividade, e das conversas com Richard Wilhelm, estudioso da filosofia chinesa e tradutor do I Ching. Finalmente, ele deu mais forma ainda ao conceito, embasando-o de fato na física através dos diálogos com o físico alemão Wolfgang Pauli, vencedor do Premio Nobel pelo Princípio de Exclusão, que implicava a descoberta de um padrão abstrato que se oculta debaixo da superfície da matéria e que determina seu comportamento de modo “acausal”. Basicamente, o que a Marcela nos explicou anteriormente. A ideia é que tudo no universo está interligado por um tipo de vibração, e que duas dimensões (física e não física) estão em algum tipo de sincronia.
Formação do conceito SINCRONICIDADE por Jung = física moderna + filosofia oriental (principalmente a chinesa) + observações na prática clínica de fenômenos reais que não se enquadravam na visão ocidental causalista
Sincronicidade: termo utilizado por Jung pela primeira vez em publicações científicas em 1929, porém ele demorou mais 21 anos para acabar o livro "Sincronicidade: um princípio de conexões acausais", onde expõe o conceito e propõe o início da discussão do assunto. Um de seus últimos livros e segundo ele o de elaboração mais demorada devido à complexidade do tema e da impossibilidade de reprodução dos eventos em ambiente controlado.
Diante das constatações de Jung sobre a complexidade do tema, o que pretendo hoje é fazer um esboço do conceito de Sincronicidade. Mais importante do que a compreensão racional, é que as ideias apresentadas os remetam às suas vidas e tragam um novo olhar para seus eventos. Para facilitar um pouco essa compreensão, além da preocupação com as definições conceituais, que são a língua da razão, me preocupei também em trazer um pouco da língua da emoção, por isso pretendo apresentar alguns mitos e passagens de textos literários, pois acredito que assim podemos contemplar pelo menos duas partes do elefante!
A ideia de que os eventos coincidentes que apresentam uma relação aparente de significado estão interligados, não é nova.
460 a 375 a.C.: Hipócrates, pai da Medicina, acreditava que o universo era mantido coeso por "afinidades ocultas", e escreveu: "existe um fluxo comum, uma respiração comum, todas as coisas estão em simpatia" à coincidências seriam explicadas pela tendência dos elementos "simpáticos" entre si a se atraírem.
1557: Pico Delia Mirándola, filósofo renascentista "Primeiramente existe uma unidade nas coisas, pela qual cada coisa é una. Em segundo lugar, existe a unidade pela qual cada criatura é ligada às outras, e todas as partes do mundo constituem um só mundo”.
1778 a 1860: Arthur Schopenhauer, fala da coincidência como "a ocorrência simultânea de fatos cujas causas não estão ligadas (...) isto é algo que ultrapassa a nossa capacidade de compreensão e só pode ser concebido como algo possível graças a uma maravilhosa harmonia preestabelecida. Todos dela participam. Logo, tudo é interligado e mutuamente afinado”.
“Toda a realidade pode estar fundada em um substrato ainda não conhecido que possua qualidades materiais e psíquicas ao mesmo tempo”. (Jung)
Definição de Sincronicidade: “(...) coincidência, no tempo, de dois ou vários eventos, sem relação causal mas com o mesmo conteúdo significativo, em contraste com “sincronismo” cujo significado é apenas o de ocorrência simultânea de dois fenômenos”. (JUNG, Vol. VIII/3, parág. 849)
Sincronicidade X Sincronismo à o que os diferencia é o significado
Evento sincrônico = eventos que ocorrem ao mesmo tempo (aviões decolarem na mesma hora, pessoas irem ao auditório ao mesmo tempo, não há significado nessas coincidências)
Sincronicidade: do grego sin = junto, cronos = tempo à Tempo coincidente
Qual a relação que vocês têm com o tempo? Sentem o tempo devorador? E o tempo criativo? As vezes sentem que o tempo como o sentiram em determinada situação é diferente do tempo que o relógio marcou? Em que situações isso acontece?
Pensar sincronisticamente é abrir espaço para um novo “tipo de tempo”, diferente do tempo do relógio a que estamos acostumados. É um tempo sutil, difícil de ser descrito, por isso o descrevo através da mitologia.
CHRONOS E KAIRÓS
Os gregos antigos tinham duas palavras para o tempo: chronos e Kairós. Enquanto chronos refere-se ao tempo cronológico, ou sequencial, que pode ser medido, Kairós refere-se a um momento indeterminado no tempo, em que algo especial acontece, em Teologia, é "o tempo de Deus".
Vamos recorrer à mitologia grega para ampliar a compreensão desses dois “tipos de tempo”.
Chronos tem sido frequentemente confundido com o titã Cronos, especialmente durante o período alexandrino e renascentista.
De acordo com a teogonia órfica, Chronos surgiu no princípio dos tempos, formado por si mesmo. Era um ser incorpóreo e serpentino possuindo três cabeças, uma de homem, uma de touro e outra de leão. Uniu-se à sua companheira Ananke (a inevitabilidade) numa espiral em volta do ovo primogênito separando-o, formando então o Universo ordenado com a Terra, o mar e o céu.
Permaneceu como um deus remoto e sem corpo, do tempo, que rodeava o Universo, conduzindo a rotação dos céus e o caminhar eterno do tempo, aparecendo ocasionalmente perante Zeus sob a forma de um homem idoso de longos cabelos e barba brancos, embora permanecesse a maior parte do tempo em forma de uma força para além do alcance e do poder dos deuses mais jovens.
Uma das representações mais bizarras de Chronos é a de um homem que devora o seu próprio filho. Esta representação deve-se ao fato de os antigos gregos tomarem Chronos como o criador do tempo, logo, de tudo o que existe e possa ser relatado, a exemplo do Deus único e criador dos cristãos, judeus e muçulmanos, sendo que, por este fato, se consideravam como filhos do tempo (Chronos), e uma vez que é impossível fugir ao tempo, todos seriam mais cedo ou mais tarde vencidos (devorados) pelo tempo.
Na mitologia grega, Kairós (“o momento certo” ou “oportuno”) aparece tanto como filho de Chronos quanto como filho de Zeus. Ao tempo existencial os gregos denominavam Kairós e acreditavam nele para enfrentar ao cruel tirano Chronos. Na filosofia grega e romana é a experiência do momento oportuno. Os pitagóricos lhe chamavam Oportunidade. Kairós é o tempo em potencial, tempo eterno, enquanto que Chronos é a duração de um movimento, uma criação.
Kairós, o deus da oportunidade, era filho de Zeus - o deus dos deuses e de Tykhé, a divindade da fortuna e prosperidade. Descrito como um belo jovem calvo com um cacho de cabelos na testa, ele era um atleta e tinha uma agilidade incomparável. Resplandecente e com a flor da juventude, Kairós tinha duas asas nos ombros e nos joelhos. Se assemelhava a Dioniso; tinha as bochechas vermelhas e a pele delicada.
Sempre sem roupas, ele corria rapidamente e só era possível alcançá-lo agarrando-o pelo topete, ou seja, encarando-o de frente. Depois que ele passava, era impossível persegui-lo, pegá-lo ou trazê-lo de volta. Na entrada do estádio em Olímpia havia dois altares: um era consagrado a Hermes, que simbolizava os jogos, e o outro era consagrado a Kairós, que simbolizava a oportunidade.
Entre os romanos era chamado de Tempus, o breve momento em que as coisas são possíveis. Kairós tinha o poder do movimento rápido que podia passar despercebido aos olhos desatentos, tornando impossível recuperar a visão de sua passagem. Dada à sua natureza difícil, raramente proporcionava uma segunda chance.
Chronos era descrito como o velho, o Senhor do tempo, das estações, da pressão das horas ordenadas pelo relógio e pelos dias, meses e anos determinados pelo calendário. Cruel e tirano, Chronos controlava o tempo desde o nascimento até a morte, aquele tempo comum, real, visível e rotineiro. O Tempo Chronos era o ditador da quantidade de coisas realizadas durante o dia, o tempo burocrático, o tempo humano, o tempo que nunca é suficiente, o tempo que escraviza, preocupa e estressa. Chronos deu origem ao cronômetro e aos medidores do tempo, o tempo dos homens.
Kairós era descrito como um jovem que não se importava com o relógio, o calendário e o tempo cronológico. Kairós era o tempo que não podia ser cronometrado, o tempo que não pertencia a Chronos porque não era previsível, apenas acontecia, por isso chamado de momento ou oportunidade. É o tempo divino que o vento traz, a vida conspira, decide acontecer sem tempo, sem hora marcada, se manifesta instante a instante e permanece eterno. Kairós marca os momentos que se tornam eternos, ainda que tenham sido breves.
Chronos é a nossa vida programada, quando devemos chegar ao trabalho, quando ocorrem os nossos encontros marcados, o tempo pelo qual temos de responder: o Tempo-Pai. O segundo, Kairós, é muito diferente. Mais do que um tempo medido, é a participação no tempo; o tempo que nos envolve de tal maneira que o perdemos de vista; o tempo atemporal, os momentos em que o relógio para; um tempo que nutre, que renova, que é mais maternal. O tempo Kairós ocorre quando estamos relaxados, de papo para o ar, ao sol, quando o tempo parece ter-se ampliado amoldando-se às nossas necessidades. Ele ocorre quando estamos totalmente concentrados naquilo que estamos fazendo. Acompanha sempre momentos de significado emocional ou espiritual – o tempo em que nos sentimos “unos-com” mais do que separados do Todo, do amor que nos interliga aos outros.
O princípio de sincronicidade na mitologia grega é representado pelo deus Kairós. Este vai reger a constelação desses encontros, pois ele é o tempo significativo que une as diferentes tramas individuais na rede simbólica da vida, por isso tem os pés alados que lhe propiciam andar em muitos níveis da consciência.
Além desses mitos, trago uma passagem do Antigo Testamento, Eclesiastes, Cap. 3, que fala do tempo de Kairós.
Antigo Testamento, Eclesiastes, Cap. 3
“Para tudo há um tempo, para cada coisa há um momento debaixo dos céus:
Tempo para nascer, e tempo para morrer; tempo para plantar, e tempo para arrancar o que foi plantado;
Tempo para matar, e tempo para sarar; tempo para demolir, e tempo para construir;
Tempo para chorar, e tempo para rir; tempo para gemer, e tempo para dançar;
Tempo para atirar pedras, e tempo para ajuntá-las; tempo para dar abraços, e tempo para apartar-se.
Tempo para procurar, e tempo para perder; tempo para guardar, e tempo para jogar fora;
Tempo para rasgar, e tempo para costurar; tempo para calar, e tempo para falar;
Tempo para amar, e tempo para odiar; tempo para a guerra, e tempo para a paz.
(...) Aquilo que é, já existia, e aquilo que há de ser, já existiu; Deus chama de novo o que passou”.

Vivemos mergulhados no tempo de Chronos, e damos pouco espaço a Kairós. A nossa proposta hoje é que abramos espaço para o deus alado! Quando falamos em Sincronicidade, falamos de simultaneidade de eventos. O centro é o tempo, o que se pergunta é o que é provável que aconteça conjuntamente, de modo significativo, no mesmo momento, é um instante de tempo em que estão aglomerados os eventos, existe o momento crítico que constitui o fato unificador.
Percebam que a questão do tempo é central em nossa discussão, uma vez que se trata de eventos que acontecem ao mesmo tempo, mas sem qualquer relação de causa. É o fato de possuírem relação de significado que nos coloca no tempo de Kairós. É um momento, é oportunidade!
Além da questão do tempo, temos outro ponto importante, que é o das relações de causa ou significado.
A Marcela nos falou da mudança de paradigma, começamos a sair de um funcionamento exclusivamente causal para conceber a possibilidade de outros tipos de explicação para os eventos.
Vamos ouvir uma fala do Jung:
“Estamos tão acostumados a considerar o “sentido” como um processo ou um conteúdo psíquico, que relutamos em admitir que ele possa existir também fora de nossa psique. Entretanto, estamos convencidos, pelo menos, de que sabemos o suficiente a respeito da psique, para negar a ela, e muito menos ainda à consciência, qualquer poder mágico. Se, portanto, sustentamos a hipótese de que um só e mesmo significado (transcendental) pode manifestar-se simultaneamente na psique humana e na ordem de um acontecimento externo e independente, entramos em conflitos com os pontos de vista científicos e epistemológicos habituais. (...) A grande dificuldade está em que nos faltam totalmente os meios científicos para provar a existência de um sentido objetivo que não seja, ao mesmo tempo, um produto da psique. Mas, temos de admitir semelhante ponto de vista, para não recairmos na causalidade mágica, e postular para a psique um poder que ultrapassa de muito os limites de sua esfera empírica”.(Vol. VIII/3, parág. 905)
Ele supõe que a psique e a matéria não são comparáveis entre si, mas são propriedades do mesmo e único ser, ambos são representações de um mesmo universo.
Pensemos primeiramente no funcionamento de nossos cérebros.
Hemisfério esquerdo: centro da fala, controla o lado direito do corpo, usa a lógica e racionalidade do pensamento linear para chegar a conclusões, base da pesquisa e observação científicas, vê as partes e as relações de causa e efeito entre elas, vê o mundo como algo separado de si, a ser usado e dominado à estilo efetivo e masculino
Hemisfério direito: imagens, mais do que palavras, são seus instrumentos, intuitivo, contém ambiguidades e oposições, capta o todo e não a parte, compara por metáforas e não por medidas à estilo reflexivo, receptivo, feminino
Me digam, em nossa cultura ocidental, qual o hemisfério mais valorizado?
Percebam então que não é uma questão de certo ou errado, é uma questão do que é mais valorizado e do que é negligenciado. Jung afirma categoricamente que a doença é a unilateralidade. O que temos vivido em nossa cultura ocidental é exatamente a unilateralidade do corpo, da razão, da lógica, do pensamento causal.
Princípio da causalidade X Princípio da sincronicidade
Causalidade: insuficiente para explicar certos fenômenos à pensamento causal = linear, antes (causa) e depois (efeito); previsível; cisão entre aspectos físicos e psíquicos. Física quântica (nível microfísico) mostra que causalidade não é lei absoluta (é tendência ou probabilidade dominante)
Sincronicidade: experiência subjetiva à capacidade de notar um estado interior subjetivo e conectá-lo intuitivamente a um evento exterior a ele interligado à co-incidência de eventos significativa para quem deles participa à cada experiência sincronística é única
Assim, o que propomos é a saída da unilateralidade, e a busca por outro tipo de olhar, o da intuição, do significado, do símbolo.
Com o conceito de sincronicidade, é possível começar a compreender a ideia de que “Nada é por acaso”. Coloca-se de lado o reducionismo da explicação causal, e inicia-se um olhar mais profundo sobre os eventos e seus significados.
Com a física quântica e a teoria da relatividade, como a Marcela afirmou anteriormente, começa a conceber-se algum tipo de relação que não seja do tipo causa e efeito, e unicidade entre observador e observado.
Afirmei várias vezes que essa unilateralidade racional é característica da cultura ocidental. Também disse que Jung formulou o conceito de sincronicidade a partir da física e da filosofia oriental. A Marcela falou bastante da física, falemos então um pouco sobre a filosofia oriental e como ela nos complementa.
Oriente e Ocidente = partes de um todo, dois aspectos interiores de cada indivíduo.
Ideia básica do pensamento oriental: há conexão entre a psique humana e as ocorrências exteriores, entre o mundo interior e o exterior à realidade essencial: conexão subjacente entre nós e os outros, entre nós e o universo = Tao
A experiência do Tao ou de um princípio unificador no universo interligando tudo o que existe no mundo é a base das principais religiões orientais: hinduísmo, budismo, confucionismo, taoismo e zen à todas afirmam que a totalidade dos fenômenos (pessoas, animais, plantas e coisas), desde as partículas atômicas às galáxias, são aspectos do Uno.
Religiões ocidentais (da tradição ortodoxa judeu-cristã) = enfatizam as dualidades em oposição, em cima Deus e embaixo o humano pecador, a alma em oposição ao mundo.
Wilhelm traduziu Tao por sentido. Como se realiza isso, essa conexão com algo maior, a conexão de nós (parte) com o todo? Imitação? Razão? Vontade?
Parem e pensem em quantas pessoas vocês conhecem que tem procurado atividades de origem oriental, como meditação, ioga, artes marciais, acupuntura, mesmo as religiões, como o budismo. O que acham disso? O que essas pessoas buscam? O que falta a elas?
Parece que há uma necessidade por esse olhar, por essa forma de ver e se conectar com o mundo.
O que acontece muitas vezes é uma racionalização de tais práticas. Acredita-se que por fazer o exercício do ioga, cantar o mantra ou lutar, esteja-se praticando o que os orientais praticam. A questão é que o que os diferencia é justamente o olhar para o mundo, a filosofia de vida, e isso também precisa ser incorporado.
Percebam que esse tipo de pensamento fica na sombra do Ocidente e aparece na Astrologia, por exemplo, de forma sombria, reducionista, como nas pessoas que começam o dia lendo o horóscopo no jornal (redução), ou em superstições infundadas.
Nossos pressupostos históricos são totalmente diferentes dos orientais. É importante que encontremos formas de incorporar esse olhar às nossas vidas, mas desde que isso seja inteiro e faça sentido para nós, não seja algo imposto de fora para dentro, e sim uma transformação de dentro para fora.
Cura da cisão psicológica = através da união interior, permissão do fluxo entre os hemisférios esquerdo e direito, lado científico e espiritual, masculino e feminino, ocidente e oriente.
Conceber então a sincronicidade como algo que apresenta a conexão entre dentro e fora, com significado, é trazer um pouco desse novo olhar. Aproximar-se do pensamento oriental é menos copiar-lhe os métodos, mas sim amplificar a consciência da nossa experiência por meio dos símbolos que o Oriente nos oferece.
Metáfora do um com o Todo:
“Para ver um mundo num grão de areia
E um céu numa flor silvestre,
Segure o infinito na palma de sua mão,
E a eternidade numa hora”. (William Blake)

Jung traz a ideia da alquimia de unus mundus, um mundo único, total, seria a unidade de toda a natureza; realidade unitária, dos domínios físicos e psíquico à Realidade psicofísica (pressupõe-se sua existência) que se manifesta esporadicamente no evento sincronístico (a partir disso chegou à ideia de unus mundus)
Essa noção de unus mundus aproxima-se da visão oriental que sempre viu os fenômenos como pertencentes a uma unidade transcendente e que se ligam por meio de fios de significados a uma infinita rede.
Eventos sincronísticos = não são apenas acontecimentos irregulares e esporádicos, sem qualquer ordem. São fenômenos aleatórios de ordenação acausal à pressupõe-se que existe, nas duas realidades (física e psíquica) uma espécie de ordem ou ordenação intemporal, que se mantém constante.
Até o momento, não se pode afirmar nada sobre qualquer tipo de regularidade ou lei que rege o princípio da sincronicidade, portanto, não há como fazer previsões acerca dele. Jung, após longa discussão e reflexão, concluiu que temos que admitir, por mais que isso irrite nossas mentes racionais, que os eventos sincronísticos são histórias do tipo “é assim mesmo”. Mesmo quando se fala em adivinhações, percebe-se que os eventos reais nunca são previstos, mas, apenas, a qualidade de possíveis eventos.
Abrir mão da razão e aceitar que há algo milagroso, que não obedece às leis da natureza.
Mas, como ocidentais que somos, não vamos abrir mão completamente da razão e vamos trazer um pouco mais de teoria psicológica à essa discussão.

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