Páginas

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Psicoterapia sem dignidade!

Assim nos fala Otto em The Homeric Gods, sobre o deus Hermes




Este é Hermes, o servo diligente e sem dignidade a que Rafael López-Pedraza nos apresenta em "Hermes e seus filhos".

Mas por que uso esse espaço para falar disso?

O autor propõe a psicoterapia pensada e praticada de forma hermética, diz que Hermes é o deus da psicoterapia!

Ousado!

A leitura não é simples, as ideias não são comuns. Demorei a entender do que o autor estava falando! Talvez eu estivesse lendo o texto tal qual Apolo, deus oposto a Hermes. Quando me preocupei menos em entender literalmente o que estava sendo dito e sentir de que forma o texto me tocava, as coisas começaram a mudar.

Confesso que ainda não terminei o livro, afinal, neste momento me preparo para iniciar a supervisão da disciplina Psicodiagnóstico, a qual nunca dei, e isso requer estudo!

Mas Hermes vem me acompanhando há alguns meses, e do que li até agora, compartilho algo que mais me chamou a atenção

SEM DIGNIDADE

É isso mesmo? López-Pedraza utiliza Hermes para dizer que o psicoterapeuta deve ser não dignificado.
Novamente, demorei a entender o que ele queria dizer. Mas, novamente, porque eu precisava antes sentir, aquilo precisava fazer sentido para mim de alguma maneira. Assim, foi a seguinte passagem que clareou tudo para mim:

"Se nós, psicoterapeutas, nos comportamos de modo excessivamente dignificado no nosso trabalho, então como entrar em contato com aquela parcela dos pacientes que, principalmente, procuram os analistas para discutir os aspectos não dignos de suas vidas? Só um Hermes alheio à dignificação na pessoa do analista pode constelar uma comunicação com um lado sem dignidade da vida, e pode avaliar hermeticamente o que foi relatado como desprovido de nobreza". (p.21)
É isso!!!
Estamos acostumados a nos sentar no trono da dignidade, dos valores, da moral, do certo e errado, da verdade. Esse lugar é bonito, é confortável, é atraente aos olhos dos outros! Mas a psicoterapia não é um lugar qualquer, ser psicoterapeuta não é uma profissão qualquer. Receber um outro machucado, sofrido, fragilizado, é de grande responsabilidade.
Dizer o que é certo é fácil. Dar conselhos, mais ainda! Mas isso só acontece se partimos do princípio de que alguém pode saber a verdade do outro, ou de que existe uma verdade absoluta.

Por tudo isso, o autor, e compartilho de sua opinião, propõe que o psicoterapeuta abra mão de sua dignidade. O que isso significa?
O paciente nos chega carregado de julgamentos sobre os outros, sobre si e suas atitudes, sentimentos e pensamentos. Do que ele precisa? De mais julgamento?

Enquanto psicoterapeutas, nos despimos das verdades, da moral, dos valores. Como Jung disse, devemos ser uma alma diante de outra alma.

López-Pedraza fala em seu outro livro, "Ansiedade Cultural", no capítulo " A Consciência do Fracasso", que se a pessoa procura a psicoterapia, é porque está vivenciando algum fracasso. E como é difícil lidar com o fracasso... aliás, outro dia falo mais sobre isso...

Portanto, recebemos esse outro que nos procura para mostrar tudo aquilo que não mostra a mais ninguém, muitas vezes nem a ele mesmo. Acolhemos de coração aberto, sem julgamento, sem regras, sem dedos apontados.
E como isso é libertador, não só para os nossos pacientes, mas também para nós, psicoterapeutas. Passamos a ser menos rígidos e mais acolhedores conosco e com aqueles que estão próximos de nós. Levamos essa atitude não dignificada para nossas vidas.

Por isso, sem dignidade! (espero que agora consigam não ter tantos arrepios ao lerem essas duas palavrinhas juntas. Até que faz sentido não é?)
Mas como Hermes: sem ser vulgar ou repugnante.

Se isso é fácil? Se sempre consigo?
Acho que já sabem a resposta.

Mas continuo tentando...

"Mas essa maravilhosa destreza torna-o o ideal e também o patrono dos servos. Tudo que é esperado de um servo diligente - habilidade para acender o fogo, para rachar a boa lenha, para assar e fatiar a carne, para verter o vinho - vem de Hermes, cujas qualidades fazem dele um servo tão eficiente para os olímpicos. [...] Confessadamente, essas não são artes nobres... [...] se compararmos Hermes com seu irmão Apolo ou com Atena, observamos nele um certa falta de dignidade. [...] embora o mundo de Hermes não seja excelso, e inclusive suas manifestações característica produzam uma impressão definitivamente indigna e em geral bastante dúbia, mesmo assim - e isso é verdadeiramente olímpico - ele está muito longe de ser vulgar e repugnante".

5 comentários:

  1. Debi! Adorei seu blog e sua participação na tv! Vi e li tudo! To cheia de orgulho e admiração!! Que 2011 seja cheio de mais sucesso psicológico!! =)
    BEijão

    ResponderExcluir
  2. Quero ser um Psicoterapeuta Hermético então!!!!

    Parabéns, muito bom o texto!

    ResponderExcluir
  3. Procurando algo para ler revisito esse texto e as coisas começam a fazer mais sentido agora :)

    ResponderExcluir
  4. Que legal Marcos! São coisas que a gente vai experimentando na pratica né??? Abs

    ResponderExcluir